O Conselho Regional de Psicologia de Mato Grosso do Sul – 14ª Região vem, por meio de suas Comissões de Psicologia e Povos Indígenas e de Gênero e Diversidade Sexual, expressar indignação frente à violência contra os Povos Indígenas, que ocorre no país, em geral, e no Mato Grosso do Sul, especificamente. Os direitos negados e violados contra os Povos Indígenas juntamente com a omissão do Estado não é um fato recente e que ocorre somente no Mato Grosso do Sul, embora este estado seja um dos mais violentos contra os indígenas. Nesse sentido, não podemos deixar de citar o papel do ruralismo nesse cenário e a consequente falta de demarcação de terras,intensificando, portanto, os conflitos por território. Ainda, considerando a proximidade com a cidade, as atividades ilegais em seus territórios, as investidas de grupos religiosos com intuito de evangelização, o fácil acesso às bebidas alcoólicas e a outras drogas, entre outros, vemos aumentadas as violências as quais, historicamente, esses povos vêm sendo expostos.
O Mato Grosso do Sul é o segundo estado com maior número de indígenas do Brasil, onde vivemoito etnias: Guarani, Kaiowá, Terena, Kadiwéu, Kinikinaw, Atikun, Ofaié e Guató. E apesar dessadiversidade de povos, este estado apresenta altos índices de violência contra indígenas (IBGE, 2010).
Uma tragédia recente que podemos utilizar de exemplo dessas violências é a morte (em investigação pelos órgãos competentes) do jovem líder Guarani Kaiowá Cleijomar Rodrigues Vasques, ocorrida no dia 12 de novembro de 2022. Chama atenção que houve outras duas situações bastante similares que ocorreram anteriormente com os indígenas Timi Vilhalva e Gabriel Rodrigues, dado que todos os três eram autodeclarados homossexuais. Temos, portanto, três jovens indígenas e homossexuais, cujas vidas lhes foram tiradas por motivos em investigação.
Queremos ressaltar que a luta pela terra é a mãe de todas as lutas, então não podemos falar de saúde indígena, educação escolar indígena, saúde mental voltada para povos indígenas, alimentação ou qualquer assunto relacionado a existência indígena sem a demarcação de seu território, já que,quando não se tem o seu território demarcado, a violência acontece não somente contra seus corposfísicos, mas atinge também sua espiritualidade, sua cultura e sua existência dentro de sua comunidade. Também, Povos Indígenas enfrentam o racismo e a privação de direitos, que acabam colocando-os em maior vulnerabilidade, podendo chegar ao etnocídio, que é a extinção da cultura, pelo extermínio de tradições, de idiomas e, inclusive, do território.
O fato de que eram homossexuais certamente colocou os três jovens em posição de ainda maior vulnerabilidade a violências, não necessariamente no convívio com seu povo, mas especialmente fora dele. Apesar de termos prerrogativa legal criminalizando o preconceito contra a comunidade LGBTI+, desde 2019, enfrentamos problemas no registro de dados e nas compilações de dados censitários, de maneira geral.
O Grupo Gay da Bahia, fundado em 1980 e com sede em Salvador (Bahia), vem reunindo dados e produzindo relatórios anuais sobre mortes motivadas por ódio contra a comunidade LGBTI+, e apontou para um assassinato ou suicídio de pessoa LGBTI+ a cada 34 horas, no Brasil, em 2022. Além disso, a organização Transgender Europe apontou que, em 2022, o Brasil ocupava o topo do ranking de assassinatos de pessoas transexuais, pelo 13º ano consecutivo.
Pelo exposto, declaramos ser urgente que a sociedade sul-mato-grossense perceba a necessidade de desenvolver metodologias de enfrentamento às violências estruturais com perspectivas interseccionais, especificamente no combate ao racismo, à misoginia, e às violências contra gêneros e sexualidades dissidentes.
Por fim, manifestamos apoio aos Povos Indígenas e à população LGBTI+ que estãoinseridos neste território, destacando a dimensão ético-política da Psicologia, e convocamos acategoria e a sociedade sul-mato-grossense para desenvolvermos ações permanentes e sistemáticas que viabilizem condições para o desmantelamento das violências estruturais, na defesa dos direitos e na ampliação de políticas públicas para populações em maior vulnerabilidade.