Com uma programação diversa entre os dias 17 e 25 de maio, a III Semana da Luta Antimanicomial de Mato Grosso do Sul e o V Encontro do Cerrado mobilizaram centenas de pessoas dos municípios de Campo Grande, Três Lagoas, Dourados, Corumbá e Paranaíba em torno de uma pauta urgente: a construção de uma saúde mental pública, ética, inclusiva e livre de práticas manicomiais.
Inspirado na trajetória e obra de Arthur Bispo do Rosário — artista símbolo da resistência e da potência criativa frente à exclusão institucional —, o evento de 2025 convidou à reflexão sobre os limites entre loucura, arte e cidadania. Em cada encontro, debate e atividade, reafirmou-se a importância do cuidado em liberdade, da escuta sensível e da valorização da autonomia de cada pessoa.
Abertura e reflexões iniciais
A programação começou no dia 17 de maio com a Mostra Regional de Práticas Profissionais – A Psicologia na Luta pelo Cuidado em Liberdade realizada pelo CREPOP, reunindo experiências e iniciativas que colocam o cuidado humanizado no centro da atenção psicossocial e apresentação de trabalhos.
No dia 19 de maio, a cerimônia de abertura foi marcada por uma roda de conversa com a participação de representantes de instituições e autoridades locais. Estiveram presentes: Rosângela Fernandes Pinheiro, representando o Fórum Sul-Mato-Grossense da Luta Antimanicomial e o Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso do Sul; Edna Flores de Araújo, representando o Fórum dos Usuários do SUS; Paulo Godofredo Barbosa de Carvalho, conselheiro da mesa diretora do Conselho Municipal de Saúde; Walkes Jacques Vargas, presidente do Conselho Regional de Psicologia da 14ª Região (MS); Elódia Herminia Maldonado, representando a secretária municipal de Saúde de Campo Grande, Dra. Rosana Leite de Melo; Arielle Jheniffer Lima do Nascimento Vicentini dos Reis, coordenadora da RAPS, representando o secretário de Estado de Saúde, Maurício Simões Corrêa; Ronaldo de Souza Costa, superintendente do Ministério da Saúde em Mato Grosso do Sul; e Avany Cardoso Leal, coordenadora do curso de Psicologia da Faculdade Insted.
Em sequência, aconteceu a palestra de Ana Paula Freitas Guljor (doutora em Saúde Pública pela Fiocruz e atual presidenta da Associação Brasileira de Saúde Mental – ABRASME), abordando os desafios e avanços da Reforma Psiquiátrica brasileira.
Arte, cuidado e políticas públicas
No dia 20, a programação teve como destaque a palestra “Bispo do Rosário: impactos na arte e luta antimanicomial”, conduzida por Vicente Sarubbi Junior (CRP06/59432), e a mesa-redonda “A arte como estratégia de cuidado em saúde mental”, com Elódia Herminia Maldonado (CRP14/03476-9), Franciele Cristina Chignolli da Silva Euzebio (terapeuta ocupacional), Priscila Maria Marcheti Fiorin (enfermeira, arteterapeuta), Sherry Nogueira Maia (assistente social) e Silvana Tude (coordenadora de Educação Ambiental), sob mediação de Ana Camila Marcelo (CRP14/08420-9).
Ainda no dia 20, Rodrigo Lopes Miranda (CRP14/06483-6) apresentou a palestra “Introdução à Reforma Psiquiátrica e à Luta Antimanicomial”, contextualizando a temática a partir de marcos históricos e legislativos.
Interseccionalidade e desafios contemporâneos
O dia 21 de maio foi marcado por diversos debates:
- A mesa-redonda “Reforma Psiquiátrica Brasileira e Questão Racial” contou com a participação de Maria Yzabella Souza Trombim Franco (CRP14/10209), Niara Muntu (CRP14/06411-8), Romilda Pizani (educadora social), Vanessa Terena (CRP14/07450-9) e Vania Lucia Baptista Duarte (ativista no movimento negro), trazendo à tona o racismo institucional e seus impactos nos cuidados em saúde mental.
- Na mesa “Reforma Psiquiátrica Brasileira e Questão de Gênero e Sexualidade”, participaram Aparecido Francisco dos Reis (cientista social), Giulia Rita (médica), Kedney Araujo (Associação Águia Morena), Rosângela Fernandes Pinheiro (enfermeira, mestranda em Psicologia) e Thaís Barros de Andrade (CRP14/08437-2), ampliando o olhar sobre como a saúde mental dialoga com a diversidade sexual e de gênero.
- A roda de conversa “Rede de Atenção Psicossocial: a rede substitutiva que temos e perspectivas para o futuro” contou com Camilla Fernandes Marques (CRP14/056627), Edna Flores de Araújo (Associação Águia Morena), Eliezer Grillo Barbosa (CRP14/05939-8), Elisângela Ficagna (CRP14/02176-9), Leiysa Sena de Carvalho Cardoso, Marina Ametlla de Oliveira (CRP14/07843-6), Márcio Luiz de Souza Godoy (CRP14/03970-1) e Otoni Cesar Coelho de Souza (advogado), refletindo sobre os avanços e desafios da RAPS no estado.
- Também foi realizada a mesa-redonda “Saúde Mental de Crianças e Adolescentes: Resolução CONANDA nº 249/2024”, com Antônio José Angelo Motti (CRP14/00140-5), Emy Mateus dos Santos (professora) e Paulo Cesar Duarte Paes (professor universitário), sob mediação de Jullyana Sueme Winkler Oshiro Galindo (CRP14/05582-8).
Encerrando o dia, aconteceu no Plenarinho da Câmara Municipal de Campo Grande a Assembleia do Fórum Sul-Mato-Grossense da Luta Antimanicomial, momento em que foi eleita a coordenação colegiada do Fórum.
Encontro do Cerrado e ações práticas
Em 22 de maio, foi realizada a mesa institucional de abertura do V Encontro do Cerrado, com representantes da UFMS e do CRP14/MS. Logo após, a mesa-redonda “Hospitais de Custódia: O mito da periculosidade da loucura” trouxe à discussão a lógica manicomial do sistema penal, com falas de Maurício Augusto Barbosa e Thiago Bagatin.
Ao longo da semana, diversas oficinas enriqueceram a programação:
- Cinema e Psicopatologia, com Simone Silveira Cougo (CRP14/05642-7)
- Confecção de Cartazes, com Sara Cristiane Jara Grubert (CRP14/09152-7), Liga de Estudos do Desenvolvimento Infantojuvenil, Juliana Cintra Marques Ferreira (CRP14/04037-0) e Ana Clara Rotilli (acadêmica)
- Nos Fios da Imaginação… Construindo Pontes no Coletivo para a Saúde Mental, com Lara Nasser Scalise (pedagoga)
- Psicodrama Público – Qual a minha Loucura?!, com Eneida Maciel Chamma (CRP14/01059-2), Isabelle Delvalles Baione (CRP14/14/08657-2) e Romulo Said Monteiro (CRP14/00042-8)
- Redução de Danos: A Alternativa Possível à Necropolítica da Guerra às Drogas, com a Associação Águia Morena
- Conscientizar para Libertar: A Luta Antimanicomial em Ação, com Gislene de Campos Soares Pereira (CRP14/00952-4) e Juliana Cintra Marques Ferreira (CRP14/04037-0)
- Ética e Gênero: Internação Compulsória – Perspectivas Passadas e Atuais, com Aline Cantini Ibarra (CRP14/07330-9) e Pietra Garcia Oliveira (CRP14/08064-5)
- Cine Debate – Bispo do Rosário, com Kárita Emanuelle (Comunicação), Lukas Elioenai do Nascimento (Audiovisual) e Ligia Burton Ferreira (CRP14/07526-3)
3ª Caminhada Antimanicomial
Um dos pontos altos da semana foi a III Caminhada Antimanicomial, realizada na manhã do dia 23, quando centenas de pessoas ocuparam a Avenida Afonso Pena, da Praça do Rádio até a Praça Ary Coelho, com palavras de ordem, cartazes, música e arte. O ato público reafirmou o compromisso coletivo com uma saúde mental que respeita direitos e promove inclusão.
1ª Corrida da Luta AntimanicomialUma novidade deste ano foi a “1ª Corrida da Luta Antimanicomial – Corrida de Participação”, que, inicialmente programada para 25/05, aconteceu em 1º de junho, em Corumbá. O evento esportivo contou com percursos de 3 e 5 quilômetros e reuniu dezenas de participantes.
Na categoria de 5 km masculino, André Rodrigues do Nascimento foi o vencedor com 17’48”, enquanto Mariana venceu entre as mulheres com 26’40”. Na prova de 3 km, os campeões foram João Pedro Medeiros (11’48”) no masculino e Juliana Paula Reis (15’07”) no feminino.Alcance regional e fortalecimento da luta
O CRP14/MS agradece a todas e todos que participaram da III Semana da Luta Antimanicomial de MS e do V Encontro do Cerrado. Nosso reconhecimento e gratidão se estendem às instituições de ensino, entidades parceiras, movimentos sociais, profissionais, estudantes, usuárias e usuários dos serviços de saúde mental que, com compromisso e sensibilidade, construíram esse momento coletivo de escuta, reflexão e resistência.Cada fala, oficina e passo dado na caminhada reafirma que só é possível construir uma política pública de saúde mental com liberdade, cuidado e dignidade. Seguimos pela consolidação de uma rede de atenção psicossocial antimanicomial, fortalecendo a luta por uma sociedade mais justa, inclusiva e livre de exclusões.